Resumo
Cada coisa é
fundamental. Não apenas nenhuma coisa é mais ou menos real do que qualquer
outra, mas nenhuma coisa é anterior a outra em qualquer sentido ontológico
robusto. Assim, nenhuma coisa pode explicar a própria existência de outra, nem
explicar como outra é o que é. essa conclusão surpreendente é alcançada ao
sublinhar duas posições importantes na metafísica contemporânea: hilemorfismo e
visões hierárquicas que empregam as chamadas relações de construção, como fundamentação.
O artigo tem três partes principais. Primeiro, observa-se que o hilemorfismo é
alegado por seus proponentes como uma resolução para vários problemas
filosóficos. No entanto, é demonstrado, à luz de um relato convincente de
explicação, que esses problemas são, na verdade, demandas para explicar o que
não pode ser senão inexplicável. Segundo, é mostrado como o argumento contra o
hilemorfismo ilumina um relato da essência de uma coisa, fornecendo assim uma
visão sobre o que é existir. Isso indica o que uma coisa, no sentido mais
geral, deve ser e um relato correlativo da estrutura na realidade. Terceiro,
argumenta-se que essa explicação da estrutura é incompatível não apenas com o
hilemorfismo, mas também com qualquer visão hierárquica da realidade. Embora o
hilemorfismo e as últimas visões sejam bem diferentes, representando tradições
filosóficas distintas, sustenta-se que elas compartilham explicações
insustentáveis de estrutura e fundamentalidade e, portanto, devem ser
rejeitadas pelos mesmos motivos.
De acordo com
a venerável doutrina do hilemorfismo, muitas coisas, incluindo objetos concretos
familiares, são compostos de matéria e forma. Essa doutrina supostamente
resolve problemas ontológicos elementares relativos à mudança, individuação e
unidade. Afirmo que ela não pode resolver esses problemas; na verdade, nenhuma
teoria pode, pois eles não são genuínos. Em vez disso, os problemas putativos
surgem de objetivos explicativos equivocados decorrentes de suposições
insustentáveis sobre o que é existir. Entender por que essas suposições são
equivocadas — e, portanto, por que o próprio hilemorfismo o é — revela uma
ontologia mais promissora, na qual cada coisa é fundamental.
Depois de
falar um pouco mais sobre hilemorfismo, apresento brevemente os problemas
putativos que ele tradicionalmente supostamente resolve. Examiná-los à luz de
um relato convincente de explicação revela que os problemas são meramente
demandas para explicar o que não pode ser senão inexplicável. Por esse motivo,
eles devem ser descartados. Essas considerações minam a motivação para o
hilemorfismo, mas também iluminam a melhor maneira de entender o Ser, isto é, a
essência de uma coisa, fornecendo assim uma visão sobre o que é existir. Isso
indica o que uma coisa, no sentido mais geral, deve ser e um relato correlativo
da estrutura na realidade. Qualquer versão reconhecível de hilemorfismo é
incompatível com a ontologia resultante, assim como qualquer visão hierárquica,
empregando as chamadas relações de construção, amplamente aceitas em discussões
contemporâneas de metafísica. Talvez surpreendentemente, embora o hilemorfismo
e essas outras visões sejam bem diferentes — representando tradições
filosóficas distintas — elas compartilham um relato insustentável de estrutura
e, portanto, devem ser rejeitadas pelos mesmos motivos.
§ i. Hilemorfismo e sua
Motivação
Acima, eu
defino hilemorfismo simplesmente como a doutrina de que muitas coisas — esta
pessoa humana, aquela árvore, aquela casa, por exemplo — são compostos de matéria
e forma. Um pouco mais pode ser dito sobre isso sem convidar disputa. A doutrina
se origina, é claro, com Aristóteles. Como todas as suas visões, sua expressão
é evasiva; como todas as suas visões, tem sido o foco de escrutínio e uma fonte
de imensa controvérsia desde a antiguidade. Assim, exatamente o que é matéria,
o que é uma forma, como forma e matéria compõem uma coisa não é fácil de dizer.
Nem está claro como exatamente as noções de potencialidade e atualidade, que
são consideradas centrais para a doutrina, devem ser entendidas.1 O
que talvez seja menos controverso é a motivação para a doutrina: ela deve resolver
uma série de problemas ontológicos elementares. Ao mostrar por que esses
problemas são ilusórios, eu tanto enfraqueço a motivação para o hilemorfismo
quanto revelo teses ontológicas inelutáveis que são incompatíveis com o cerne
da doutrina. Isso elimina a necessidade de articular qualquer versão do hilemorfismo
em grandes detalhes.
Os problemas
que o hilemorfismo supostamente resolve são explicativos. Acredita-se que se a
teorização — seja ela física ou metafísica — sobre a realidade deve ter
fundamento adequado, certos fenômenos, pertencentes às características
primordiais da realidade, devem ser explicados. Um desses fenômenos é a mudança
substancial, o surgimento e o cessar de existir de coisas como objetos
concretos familiares. Outro é a individuação, uma coisa sendo distinta de todas
as outras e, portanto, sendo a própria coisa que é.2 Um terceiro
fenômeno, o que recebeu mais atenção em discussões recentes sobre hilemorfismo,
é o da unidade. A unidade é exibida quando uma multiplicidade de coisas é, no
entanto, uma, a existência desse todo sendo contabilizada em termos de suas
partes, essas muitas outras.
Não é necessário
aqui considerar como o hilemorfismo supostamente explica esses fenômenos
ontológicos cruciais, pois não estou criticando nenhuma tentativa específica de
explicar a individuação ou a unidade (ou mudança substancial). Em vez disso, eu
desafio a pressuposição-chave que subjaz aos problemas putativos que se pensa
serem resolvidos pelo hilemorfismo, a saber, que cada um desses fenômenos
ontológicos é explicável. Se de fato nenhum é, qualquer explicação proposta é
irrelevante — e a falta de explicações não é de forma alguma problemática.
§ ii. Individuação,
Unidade e Explicação
Eu não acho
que seja apropriado considerar a chamada mudança substancial como mudança (e eu
acho que se pode sustentar isso sem negar que é impossível que algo venha do
nada). Assim, eu não vejo a mudança substancial como sendo pertinente ao hilemorfismo
da maneira que ela costuma ser e deixo o fenômeno de lado para focar na
individuação e unidade. Aristóteles introduz o hilemorfismo para explicar esses
fenômenos; a perspectiva de tais explicações — especialmente de unidade —
continua sendo uma motivação significativa para adotar a doutrina em discussões
contemporâneas.3 Claramente, então, é presumido pelos hilemorfistas
que a individuação e a unidade são passíveis de explicação. Argumento nesta
seção, no entanto, que, dada uma noção de explicação convincente, elas não são.
Acredito que
há uma única prática de explicação, operante em todos os domínios nos quais as
explicações são oferecidas, e, portanto, as seguintes observações se aplicam a
qualquer explicação, seja ela lógica, matemática, física, metafísica ou o que
quer que seja. Toda explicação tem dimensões epistemológicas e ontológicas. Uma
explicação (no sentido de um ato) é a apresentação a algum ser consciente de
uma explicação (no sentido de um objeto). Esta última é geralmente uma
representação, que aumenta o conhecimento de alguma(s) coisa(s) em termos de
outra (ou outras). Portanto, uma explicação, como ato, é uma conquista
epistêmica. Consequentemente, há uma série de condições linguísticas,
conceituais e práticas — determinadas pelos estados mentais epistêmicos e mais
gerais do ser consciente a quem a explicação, como objeto, é apresentada — que
devem ser atendidas para que essa conquista ocorra. Além desses aspectos
amplamente pragmáticos, uma explicação deve ter uma base ontológica. Estas são
as coisas no mundo — explanandum (Aquele fenômeno e/ou fato que é descrito por/em
termos de uma sentença e demanda uma explicação), explanans (Uma sentença e/ou
proposição que se refere a uma outra entidade, objeto, fato e etc. que serve de
explicação para o fenômeno descrito) e uma relação entre elas — representadas
por essa explicação (no sentido de um objeto). A relação deve ser uma da qual o
modo como a primeira é dependente ou é determinado pela última, isto é, uma
pela qual a primeira é como é por causa da última. Sem explanandum, explanans e
essa relação, não se pode ter uma explicação: falta-lhe a(s) coisa(s) sobre as
quais seu conhecimento deve ser aprimorado ou os meios de aprimorá-lo. Assim,
estou propondo aqui uma noção de explicação realista, uma na qual a explicação
só é possível se houver coisas no mundo que estejam em relações apropriadamente
robustas.4 Em defesa de tal explicação, simplesmente observo que
qualquer alternativa que evite coisas no mundo para sustentar a representação
que é o correlato do ato de explicação é deixada com uma prática que não é
restringida pela realidade e, portanto, não é legitimamente epistemológica. Uma
“explicação” que nem pode ser considerada epistêmica não é explicação alguma.
No contexto
desta explicação realista, “coisa” deve ser interpretada como tendo a máxima
generalidade. Por “coisa” não quero dizer apenas objeto concreto familiar ou
substância (em algum outro sentido). Pretendo que o termo se aplique a toda
entidade em qualquer categoria ontológica que exista. Uma noção de explicação
realista do que é explicação, então, não tem suposições ontológicas específicas
e, portanto, não exclui nenhuma ontologia. No entanto, ela tem uma consequência
ontológica crucial: não há explicação cujo explanandum e explanans seja uma
única coisa. O conhecimento de alguém não pode ser aprimorado pela revelação de
que uma coisa é como é por causa dela. Em outras palavras, nada pode se
explicar. (Embora alguma característica (ou parte) de uma coisa possa explicar
um explanandum incluindo uma característica distinta dessa mesma coisa.
Características são coisas e, portanto, a base ontológica de qualquer
explicação envolve coisas distintas.) uma representação que não apresenta algo
vis-à-vis outro (ou outros) é, na melhor das hipóteses, meramente descritiva;
pode ser informativo, até mesmo revelador, mas não pode ser explicativo, independentemente
de sua complexidade. Consequentemente, toda explicação genuína é baseada em
alguma coisa (ou coisas) em relação a outra (ou outras). A base ontológica de
qualquer explicação, portanto, pode ser representada esquematicamente como aRb,
onde a é uma coisa (ou pluralidade de coisas) que está em alguma relação
robusta, R, com b, alguma coisa (ou pluralidade de coisas) distinta de a. Seja
o que for R, independentemente de como essa relação seja entendida, deve ser o
caso de que, se for válido, seus relatos existem. Isso decorre da suposição
convincente de que uma relação só pode relacionar o que existe.5
Eu sustento,
então, que os relata (relacionados) de qualquer relação explicativa genuína são
coisas existentes. Alguns, no entanto, sustentam que os relata (relacionados)
de tais relações, pelo menos com relação ao tipo de explicações metafísicas
relevantes abaixo, são fatos.6 Existem diferentes relatos (noções)
do que é um fato. Em um, um fato é um complexo, incluindo coisas no mundo; é um
estado de coisas ou algo assim. Por outro lado, um fato é uma entidade
representacional que apresenta certas coisas no mundo como elas são, isto é,
apresentando certas coisas verdadeiramente. Se um fato é uma entidade
representacional verdadeira, ele é verdadeiro em virtude daquelas coisas no
mundo que ele apresenta. Em qualquer relato de fatos, portanto, os fatos
envolvem constitutivamente coisas no mundo. Então, mesmo que alguém sustente
que os relata de relações explicativas são fatos, a base ontológica de qualquer
explicação desse tipo é, no entanto, em última análise, coisas no mundo que
estão em alguma relação.
Dada essa
explicação realista, considere se é de fato possível, como o hilemorfista
afirma, explicar a individuação de alguma coisa, b, isto é, explicar o que
torna b distinto de todas as outras coisas e, portanto, a própria coisa que é.
Suponha que seja. Há, então, alguma representação que aumenta o conhecimento de
alguém de que b é a própria coisa que é em termos de alguma outra coisa. Essa
explicação deve ter uma base ontológica. Portanto, há alguma coisa, a, que está
em R para b ser a própria coisa que é, tal que, ao permanecer nessa relação, a
torna b a própria coisa que é. Mas isso não pode ser assim, como pode ser visto
pelo seguinte argumento.
Se a faz b
ser a própria coisa que é, há alguma relação entre a e b. para que b esteja
nessa relação (ou qualquer outra) com a (ou qualquer coisa), b deve existir. No
entanto, b não pode existir como qualquer outra coisa além de si mesmo; deve
ser a própria coisa que é — ou seja, b — e, consequentemente, ser distinto de
todas as outras. Portanto, sua individuação é uma pré-condição para b estar em
qualquer relação e, a fortiori (Por causa de uma razão maior/mais forte), estar
em R para a. Não pode ser por estar nessa relação com a, então, que é feito para
ser a própria coisa que é. Portanto, não pode haver algo que faça b a própria
coisa que é. Se não há base ontológica para explicar o que individua b, não há
explicação para b ser a própria coisa que é. Este argumento é totalmente geral
e, portanto, não há explicação para a individuação de nada. A individuação de
uma coisa é inexplicável.
Alguém pode
desafiar este argumento sustentando que ele mostra apenas que se a individua b,
então as duas coisas devem coexistir. Não se segue de sua necessária
coexistência, alguém pode argumentar, que a não seja em algum sentido anterior
a b. se for, a é — de alguma forma — mais fundamental do que b, e assim pode
fundamentar ou determinar de outra forma a individuação deste último. No
entanto, o que esse tipo de resposta ignora é que a noção relacional de
prioridade empregada aqui é supostamente explicativa. Como tal, ela é
restringida pelas normas de explicação. Nenhuma explicação genuína pode exigir
que o explanandum desempenhe um papel instrumental em permitir que a relação de
dependência na qual essa explicação se baseia seja válida. Se uma “explicação”
exigisse isso, sua relação de dependência subjacente dependeria crucialmente do
que ela supostamente deveria estar realizando em primeiro lugar. No entanto, se
a fosse explicar a individuação de b, b deve ser exatamente a coisa que é para
que a esteja em uma relação determinativa com a individuação de b. A manutenção
dessa relação determinativa dependeria crucialmente da individuação de b, que é
precisamente o que a relação supostamente deveria estar realizando. Assim, o
argumento não ignora relações putativas de fundamentação ou prioridade e não é
minado por elas; em vez disso, mostra um limite para sua aplicabilidade: se
elas são válidas, não podem fundamentar reivindicações explicativas de
individuação.
Talvez não
seja surpreendente que a individuação de uma coisa seja inexplicável. É
plausível pensar, com o bispo Butler, que tudo é o que é e não outra coisa.
Ainda assim, o precedente é um argumento para o porquê da exasperação sugerida
pelo famoso ditado ser apropriada. Não há explicação para a individuação de uma
coisa porque nenhuma coisa poderia fazer outra ser a mesma coisa que é. Se isso
estiver correto, e nenhuma coisa, independentemente da categoria, for
individuada por qualquer outra, então isso enfraquece o que é suposto ser um dos
benefícios teóricos do hilemorfismo. Alguém pode admitir que a demanda por uma
explicação da individuação é equivocada, mas sustentar que o valor real do hilemorfismo
é sua capacidade de explicar a unidade. Afinal, é essa suposta capacidade que
levou vários filósofos contemporâneos a endossar a doutrina.7 Eu
acho que essa atitude é equivocada, no entanto, pois o mesmo tipo de argumento
que vai contra uma explicação para a individuação vai contra qualquer
explicação para a unidade de uma coisa.
O ímpeto para
examinar a unidade de coisas complexas vem do chamado Problema do Um e dos
Muitos, o problema de dar conta de como algo com muitas partes é, no entanto,
um. Este é um problema antigo, mas que recebeu atenção renovada nas últimas décadas
como a Questão Especial de Composição de Peter van Inwagen (“sob quais
condições alguns objetos compõem algo?”).8 Se houver uma solução
para este problema (e uma resposta para esta questão), seria uma explicação do
que é que torna uma multiplicidade de coisas, no entanto, uma. Então, suponha,
como o hilemorfista afirma, que haja alguma explicação desse tipo. Há, então,
alguma representação que aprimora o conhecimento de alguém sobre a unidade de
b, uma coisa complexa, em termos de alguma outra coisa. Como qualquer
explicação, essa também deve ter uma base ontológica. Neste caso, a é alguma
pluralidade de coisas que está em R para b sendo unificada de tal forma que, ao
estar nesta relação, a torna b unificado. Mas isso não pode ser assim.
Se a faz de b
uma unidade, há alguma relação entre a e b. para que b fique nessa relação (ou
qualquer outra) com a (ou qualquer coisa), b deve existir. No entanto, b não
pode existir como qualquer coisa diferente de si mesmo; deve ser a própria
coisa que é — ou seja, b — e, consequentemente, ser o que é, simples ou uma
unidade complexa, conforme o caso. Neste caso, b é assumido como uma unidade
complexa. Portanto, sua unidade é uma pré-condição para que b fique em qualquer
relação e, a fortiori, de ficar em R com a. não pode ser por ficar nessa
relação com a, então, que ele é feito para ser uma unidade complexa. Portanto,
não pode haver algo que torne b unificado. Se não há base ontológica para
explicar o que unifica b, não há explicação para que b seja uma unidade complexa.
Este argumento é totalmente geral e, portanto, não há explicação para a unidade
de nada. A unidade de uma coisa é inexplicável. (Note que qualquer desafio a
este argumento com base na suposta prioridade de a para b pode ser enfrentado
mutatis mutandis com o que foi o desafio semelhante à conclusão de que a
individuação é inexplicável.)
Uma forma não
pode fazer uma coisa ser o que essa coisa é e, portanto, em particular, não
pode fazê-la ser uma unidade complexa. Nada pode fazer isso. Assim, o argumento
anterior enfraquece o outro benefício teórico putativo do hilemorfismo.
Pode-se, no entanto, sustentar que o argumento descaracteriza a explicação para
a unidade de uma coisa fornecida pela doutrina, sustentando que a forma
relacional, R, de uma coisa não faz essa coisa ser o que é ao relacionar a, sua
matéria múltipla, a b, essa unidade complexa em si. Em vez disso, a forma faz a
matéria (múltipla) da coisa ser a coisa unificada.9 Isso não pode
estar certo, no entanto. Muitas coisas não podem ser idênticas a uma coisa.10
Mesmo que pudessem, e a matéria múltipla de uma coisa fosse apenas a coisa
unificada, não teríamos os meios de explicar a unidade dessa coisa. Apesar da
complexidade da explicação ostensiva (no sentido de um objeto) — ou seja, a
forma faz a matéria (múltipla) da coisa ser a coisa unificada — sua base
ontológica seria apenas uma única coisa, a saber, a coisa unificada
(multiplicitamente) material. No entanto, como argumentado acima, não há
explicação cuja base seja uma única coisa. O que parece ser uma explicação da
unidade de uma entidade complexa é meramente uma descrição de uma única coisa
duas vezes: descrita uma vez como muitas, e novamente como uma.
Juntos, os
dois argumentos anteriores demonstram a nulidade de qualquer explicação
aparente da unidade de uma entidade complexa. Se é suposto haver qualquer
relação diferente da identidade entre os muitos e o um, a explicação putativa é
desmentida pelo primeiro argumento; se os muitos e o um são supostos idênticos,
a explicação putativa é desmentida pelo último.
Esses
argumentos contra a possibilidade de explicar a individuação e a unidade são
essencialmente os mesmos. O argumento básico é baseado na suposição fundamental
de que toda explicação tem uma base ontológica de coisas existentes em relação.
Esse argumento é tão simples, mas enfraquece tanto o que é dado como certo, que
tem um ar de sofisma. O argumento, no entanto, não é sofístico; ele
simplesmente leva muito a sério um princípio que todos devem aceitar e traça
suas consequências. Esse é o princípio de que a explicação deve terminar. A
explicação deve terminar no sentido de que deve se envolver e, portanto,
terminar no mundo. A explicação termina com as coisas no mundo. Este princípio
é consistente com a existência de séries infinitas de coisas em relação, com
algumas delas explicando outras que explicam outras, etc. Note, no entanto, que
qualquer série desse tipo é e deve ser uma série de coisas.
Uma vez que
qualquer explicação envolve, em última análise, coisas em alguma relação, há
limites para a explicação. Os argumentos anteriores demonstram que a
individuação e a unidade de uma coisa não podem ser explicadas. O mesmo tipo de
argumento também mostra que a existência de uma coisa — que é uma pré-condição
de estar em qualquer relação, explicativa ou não — não pode ser explicada, nem
qualquer fenômeno associado à própria existência dessa coisa, notavelmente, seu
ser o que é e, mais geralmente, seu ser como é essencialmente.11 Se
nem a existência de uma coisa nem sua individuação nem como ela é
essencialmente podem ser explicadas, em nenhum sentido genuíno uma coisa por si
só pode ser explicada. As coisas são os elementos da explicação e, portanto,
cada uma delas está além de seus limites.
Não há nada
no mundo além de coisas (no sentido mais inclusivo de "coisa") e não
se pode explicar uma coisa. Não se segue, no entanto, que não haja explicações.
Embora uma coisa em si esteja além da explicação, o arranjo das coisas — todas
elas ou, dados interesses mais práticos, alguma pluralidade delimitada delas —
é passível de explicação. O arranjo de todas as coisas é a estrutura do mundo;
algum arranjo menos inclusivo é um fenômeno estrutural. Pode-se, em princípio,
explicar essa estrutura ou os múltiplos fenômenos que ela compreende. Assim,
por exemplo, pode-se explicar: por que uma cômoda, que pode (e existiu) sem ser
verde, agora é de fato dessa cor; por que uma amostra de sal e uma amostra de
água, ambas as quais poderiam existir na ausência de qualquer solução, juntas
produzem essa solução salgada; por que um aglomerado de células, que eram (e,
portanto, talvez, poderiam ter sido) saudáveis, são, no entanto, cancerígenas;
por que uma sociedade que poderia ser pacífica é dilacerada pela guerra; por
que uma pessoa, capaz de realizar tantas ações, está atualmente misturando
massa na cozinha. Em todos esses exemplos, o explanandum não é uma coisa em si,
mas um fenômeno estrutural. Como tal, o explanandum não é uma coisa, mas uma
pluralidade delas, algumas coisas em alguma(s) relação(ões).
Qualquer
explicação requer, é claro, que seu explanandum exista, para que não haja
fenômeno para explicar; requer não menos a existência de seu explanans, para
que não haja coisa(s) para iluminar, por meio de alguma relação, o explanandum.
Nenhuma explicação, então, explica a existência do explanandum, ela só pode
explicar por que essas coisas estão relacionadas como de fato estão (quando não
precisam estar). O meio dessa explicação, e a fonte da iluminação que ela
fornece, é aquela outra coisa (ou aquelas outras coisas), o explanans, estando
em alguma relação com a primeira. Portanto, enquanto os arranjos das coisas
podem ser explicados em termos de coisas, no final da investigação, o máximo
que um investigador pode fazer com respeito a cada coisa em si é apreciá-la, o
que e como ela é essencialmente e as capacidades que tem para interagir com
outras coisas.12
Se a
justificativa para endossar o hilemorfismo é sua capacidade de explicar a
individuação e a unidade das coisas, então, dado que não pode haver tais
explicações, não há razão com base nisso para aceitar a doutrina. Assim, as
expectativas explicativas que motivam o hilemorfismo são equivocadas. A
discussão anterior, no entanto, faz mais do que minar as razões para aceitar o
hilemorfismo, ela fornece insights suficientes sobre o que uma coisa (no
sentido mais geral) deve ser para mostrar que qualquer versão reconhecível da
doutrina é insustentável.
§ iii. Coisas com
Naturezas x Coisas Naturalizadas
Não pode
haver explicação para a individuação ou unidade de uma coisa, em última análise
porque não pode haver nada que em relação a algum outro faça desta última a
própria coisa que é ou faça desta última o que é. No entanto, a forma ou
essência ou natureza (uso esses termos de forma intercambiável) de uma coisa é
supostamente precisamente aquilo que faz com que essa coisa seja o que é. se
não houver tal coisa, pode parecer que o argumento da seção anterior tem a
consequência de minar o essencialismo, a visão geral de que há restrições necessárias
ao ser de uma coisa. Se não há nada que faça uma coisa ser o que é, isso pode
sugerir que uma coisa não precisa ser de forma alguma, que o ser de uma coisa é
totalmente irrestrito. As considerações anteriores levantam, então, a questão
ontológica primária do que exatamente uma coisa é.
Essas
considerações não minam de forma alguma o essencialismo; pelo contrário,
revelam a versão mais promissora da visão. Seria um erro inferir da conclusão
de que a individuação e a unidade de uma coisa são inexplicáveis que uma
coisa não é a própria coisa que é ou não é o que é. A afirmação de que uma
coisa não é ela mesma é incoerente, assim como a afirmação de que ela não é o
que é. De fato, parece impossível que algo seja uma coisa distinta e não parece
mais possível que uma coisa deixe de ser o que é. Uma explicação do que uma
coisa é na qual uma coisa não precisa ser o que é, se não apenas conversa
fiada, caracteriza uma “coisa” tão ontologicamente indeterminada a ponto de não
ter nenhuma reivindicação real de ser. Tal explicação não é uma explicação de
nada. Assim, se uma coisa é (ou deve ser) a própria coisa que é e é (ou deve
ser) o que é, embora não haja nada que a faça também, isso indica que cada
coisa é suficiente em si mesma para restringir sua individualidade e o que é.
Dado que
essas restrições sobre uma coisa — ser a própria coisa que é e, portanto, ser o
que é — exigem que seja de algumas maneiras e não de outras, também existem
essas restrições qualitativas sobre ser essa coisa. Além disso, o que é e essas
restrições qualitativas adicionais restringem como essa coisa interage com
outras, restringindo assim essas outras coisas. Ser, portanto, é ser
restringido. Um ser — uma coisa — é restringido (e restringe) e é, neste
sentido, naturado.13 Uma coisa não tem uma natureza (ou essência ou
forma), no sentido de que há algo distinto dela, a saber, sua natureza que
determina a individuação dessa coisa e o que ela é e, consequentemente, como ela
interage com outras coisas. Em vez disso, essas restrições são inerentes ao seu
próprio ser; ser tão restringido é apenas o que é para essa coisa existir. Tais
restrições são como uma coisa é essencialmente, mas essas maneiras não são elas
mesmas algo. Assim, cada coisa é de certas maneiras essencialmente sem ter uma
essência e, portanto, cada uma é naturada embora careça de uma natureza.
Pode-se, se
se escolher, falar das restrições concomitantes ao seu ser como a essência (ou
natureza ou forma) daquela coisa, mas isso é bastante enganoso. Uma vez que uma
essência não é nada, qualquer conversa que sugira o contrário deve ser evitada.
Mais importante, pelas razões dadas acima, qualquer visão que reifique
essências, tratando-as como coisas que fazem — em um sentido explicativo —
outras serem o que são, não pode estar certa. A explicação essencialista do que
uma coisa é que eu defendo aqui é, então, incompatível com outras versões
notáveis do essencialismo. Locke sustenta, em uma veia Aristotélica, que a
essência é “o próprio ser de qualquer coisa, pelo qual ela é, o que é.”14
Ele está apenas parcialmente certo. A essência é de fato o próprio ser de uma
coisa. Continuar afirmando que é em virtude de (“pelo qual”) sua essência que
uma coisa é o que é implica que uma essência é algo distinto daquela coisa, uma
coisa que faz com que esta última seja o que é. Mas não pode haver tal coisa.15
O relato
também é incompatível com as posições dos dois principais defensores de um
essencialismo ontológico — em vez de modal16 — na metafísica
contemporânea. Kit Fine reifica a essência de uma coisa, identificando-a com a
definição real dessa coisa, a saber, o conjunto de proposições verdadeiras em
virtude dela.17 Olhando além da estranheza de identificar o ser de
uma coisa com um conjunto (e com o que é proposicional e, portanto,
representacional), Fine é levado a fazê-lo rejeitando a identificação do ““ser”
de [uma coisa], seu ser o que é, com sua existência.”18 ele
argumenta a favor dessa distinção desta forma: “em um aspecto, a existência é
muito fraca; pois há mais no que um objeto [isto é, coisa] é do que sua mera
existência. Em outro aspecto, a existência é muito forte; pois o que um objeto
é, sua natureza, não precisa incluir a existência como parte.”19 A
primeira alegação indica a presunção de que a “mera existência” de uma coisa
deve ser suplementada para que essa coisa seja o que é. Isso é apenas presumir
que uma coisa é feita para ser o que é por alguma outra coisa e, portanto, que
seu ser o que é é explicável em termos dessa coisa. No entanto, como
argumentei, não pode haver tal coisa. Além disso, se uma coisa é apenas uma
entidade naturalizada, não há nada mais em sua existência do que o que ela é. A
segunda parte do argumento de Fine não fornece nenhuma razão para distinguir o
ser de uma coisa o que é de sua existência, pois pode-se simplesmente
reconhecer que muitas entidades naturais podem deixar de existir. Isso tem o
benefício de não exigir a reificação da “existência” em si, como a posição de
Fine exige (dado que a existência é considerada uma parte).
O problema
subjacente aqui é uma noção empobrecida de ser, uma na qual a existência de uma
“coisa” precisa ser suplementada para que essa coisa seja o que é. É, em última
análise, uma noção desse tipo que leva à expectativa de que a individuação e a
unidade e, mais geralmente, o que uma coisa é são passíveis de explicação.
Vê-se o mesmo problema no trabalho de E.J. Lowe que endossa um essencialismo
sério segundo o qual “embora todas as entidades tenham essências, as próprias
essências nunca devem ser pensadas como entidades adicionais”. 20
Apesar dessa declaração inequívoca de sua posição, Lowe parece reificar as
essências, levado a fazê-lo por seu endosso explícito do princípio de que a
essência precede a existência. 21 Se a essência de uma coisa precede
em um sentido ontológico (e Lowe deixa claro que esse é o sentido relevante) a
existência dessa coisa, os dois devem ser distintos e, portanto, sua essência
deve ser algo além de sua existência. A essência é, presumivelmente, a coisa
que suplementa a mera existência de uma coisa, fazendo com que ela seja o que
é. É, no entanto, apenas essa explicação problemática de uma coisa — com suas
expectativas explicativas condenadas — que é impedida pela explicação de uma
coisa como uma entidade naturalizada.
A noção
empobrecida de ser que enfraquece o essencialismo de Fine e Lowe é um corolário
da suposição de que o que uma coisa é (ou sua individuação) é explicável. Essa
suposição — e, consequentemente, a explicação problemática de uma coisa — é uma
característica constitutiva de qualquer versão do hilemorfismo. O hilemorfismo
é apenas a doutrina segundo a qual uma parte distinguível, mesmo que
inseparável, de qualquer coisa (no âmbito da doutrina) é uma forma, algo que
explica o que essa coisa é. Mas, novamente, não pode haver tal coisa. Portanto,
não só a motivação para sustentar o hilemorfismo é equivocada — a doutrina não
pode resolver os problemas explicativos que deveria — a ontologia que ela
requer é insustentável. Não há formas, coisas que façam outras serem o que são,
nem “coisas” que existam, mas que precisem ser feitas o que são.
Conclusão: Cada Coisa é
Fundamental
Esta
ontologia das coisas como entidades naturais é revelada ao examinar a explicação
e discernir seus meios e limites. As consequências da ontologia são de longo
alcance, pois produz um relato correlativo da estrutura na realidade, que
impede várias visões populares em discussões contemporâneas de metafísica. Por
“estrutura” não quero dizer uma característica “primitiva” do mundo, como faz
Theodore Sider,22 nem uma variedade de coisa, cada instância da qual
ordena por “disponibilizar posições ou lugares para outros objetos, [ou seja,
coisas] ocuparem”, como faz Kathrin Koslicki.23 em vez disso,
considero a estrutura na realidade como todas as coisas que estão nas relações
que elas fazem. Esta estrutura, incluindo todas as relações, compreende as
bases ontológicas de qualquer fenômeno explicável.
A estrutura
indicada por entidades naturadas é amplamente Aristotélica, pois inclui
relações necessárias cuja proveniência são as coisas em si mesmas, em oposição
a, digamos, as capacidades conceituais ou linguísticas de seres conscientes ou
suas atividades. Essas relações são necessárias — e essenciais — porque surgem
exclusivamente do que seus relatos são e, como observado acima, nenhuma coisa
pode ser diferente do que é. Como nem a existência nem a individuação de uma
coisa, nem o que qualquer coisa é é explicável em termos de qualquer outra coisa,
cada coisa nessa estrutura é ontológica e explicativamente básica. Cada uma é,
então, neste sentido fundamental. Dada essa fundamentalidade, cada uma faz uma
contribuição única e ineliminável para a estrutura no mundo. Não existe “almoço
grátis ontológico”, no sentido de David Armstrong e, com David Wiggins, cada
coisa é de fato algo “acima e além” de qualquer outra.24
Portanto, não
existem “coisas” derivadas, existentes e derivadas que são ontológica ou
explicativamente menores que outras; a fundamentalidade não é relativa. Este
relato de estrutura contraria todos os familiares nas discussões contemporâneas
de metafísica, pois cada um deles toma como certa uma ou mais “relações de
construção”25 — por exemplo, composição, constituição,
fundamentação, realização, microbase, emergência, etc. — por meio das quais uma
coisa se constrói ou gera ou constrói ou dá origem a ou é obtida de outra. Em
alguns casos, essas metáforas de construção são elaboradas em termos
ontológicos, de modo que o próprio ser de uma coisa é “latente” e explicável em
termos de outra;26 em outros casos, é apenas o que uma coisa é que
se supõe ser explicável em termos de outras coisas. De qualquer forma, não pode
haver tais relações explicativas entre as coisas e, portanto, não há a estrutura
hierárquica à qual tal daria origem.
Não decorre
da não existência de relações de construção que cada coisa seja simples ou que
a estrutura no mundo não seja elaborada. Assumindo que existem objetos
concretos familiares, existem coisas fundamentais com partes. Há, então,
composição — algumas coisas compõem outras — embora, nota bene, um todo não
seja feito para ser pelo que é composto; é apenas uma coisa complexa, uma coisa
com partes. Uma explicação “plana” da estrutura não é apenas consistente com a
complexidade, é consistente com a dependência (ontológica). De fato, cada
entidade naturalizada é dependente de muitas coisas, pois, dado o que é, deve
existir com essas outras. Uma coisa pode ter que existir com uma outra coisa
específica (caso em que a primeira é essencialmente rigidamente dependente da
última) ou pode ter que existir com um certo tipo de coisa, embora qualquer
instância desse tipo sirva (caso em que essa coisa é essencialmente
genericamente dependente de instâncias desse tipo).27 Embora algumas
coisas possam não ser ontologicamente dependentes em um determinado sentido,
não há nada que não seja ontologicamente dependente em algum outro sentido. Uma
coisa totalmente ontologicamente independente, uma “coisa” que pode existir na
ausência de qualquer outra — incluindo todo tipo, todo atributo, todo modo — é
incompatível com ser naturalizada e, portanto, com existir de qualquer forma.
No entanto, em nenhum caso algo é feito para ser exatamente o que é ou feito
para ser o que é por meio de uma relação de dependência (assim, pace Lowe, não
há dependência em termos de identidade).
Então, a
fundamentalidade de cada coisa não descarta a composição ou a dependência
ontológica. Ela mostra, no entanto, que mesmo quando essas relações são
assimétricas, não há prioridade. O que compõe não é mais real, nem tem sequer
um privilégio explicativo sobre o que é composto. Da mesma forma, para o que é
ontologicamente dependente; não é menos real, nem tem menos privilégio
explicativo do que aquilo de que depende. Nesses casos, como em todos os
outros, há simplesmente coisas em relação(ões). Claro, com qualquer relação,
assimétrica ou não, pode-se chamar um de seus rela "anterior" ao
outro, mas isso seria apenas um rótulo apoiado em nenhum peso ontológico real
e, portanto, explicativo.
Relatos
hierárquicos da estrutura na realidade, aqueles em que algumas coisas são
supostamente anteriores a outras, surgem de muitas fontes. Há a tradição Democritiana,
com versões antigas e disfarces familiares “científicos modernos”, nos quais os
átomos — ou fundamentos físicos do dia — são as bases que explicam o próprio
ser ou modos de ser de todo o resto. Há a tradição hegemônica Humeana, na qual
os elementos básicos, os correlatos das impressões sensoriais, servem como base
ontológica e explicativa de todo o resto, e a tradição Kantiana intimamente
relacionada, na qual as mentes são as coisas privilegiadas que servem como base
explicativa para a existência ou natureza de outras coisas e as restrições
entre elas. O Hilemorfismo e o Aristotelismo, de modo mais geral, são
considerados concorrentes dessas outras tradições, fornecendo um relato bem
diferente do que existe e da ordem na realidade, um que acomoda, de forma mais
satisfatória, objetos concretos familiares e as conexões necessárias entre
eles. No entanto, o hilemorfismo, não menos do que as outras tradições, está
comprometido com a existência de existências insignificantes: “coisas” que
existem embora seu próprio ser ou natureza devam ser contabilizadas em termos
de outras coisas. As formas desempenham o papel privilegiado e ordenador na
explicação do hilemorfismo sobre a estrutura na realidade, com todo o resto
sendo o que é apenas derivativamente.
O que a
discussão anterior demonstra, no entanto, é que privilegiar algumas coisas não
leva a sério o suficiente o que é ser. Como nada pode explicar a existência ou
individuação de uma coisa ou o ser de uma coisa o que é, não há distinção entre
a mera existência de uma coisa e seu ser a própria coisa que é ou o que é. ser
é ser naturalizado e, portanto, ser fundamental. O hilemorfismo, como qualquer
outra explicação hierárquica da estrutura, não reconhece a ubiquidade da
fundamentalidade e, portanto, deve ser rejeitado pelos mesmos motivos que eles.
Notas
Gostaria de
expressar minha gratidão a Johannes Brandl e Christopher Gauker pela discussão
do conteúdo deste artigo, e a Yuval Avnur, Nathan Ballantyne, Daniel Korman,
Jonathan Schaffer e Tuomas Tahko pelos comentários escritos muito úteis sobre
um rascunho dele. Apresentei uma versão inicial do artigo na XII Conferência
Anual de Filosofia da Estônia em Tallinn. Gostaria de agradecer ao meu público
lá, especialmente a Riin Sirkel, por suas perguntas e comentários. Paul Hovda
foi o comentarista deste artigo quando apresentado na Conferência de Filosofia
do Noroeste Interior de 2017 (Metafísica na Montanha 2). Agradeço muito os
comentários incisivos e úteis de Paul, que me permitiram melhorar um argumento
crucial aqui. Também gostaria de agradecer aos outros participantes da
Conferência de Filosofia do Noroeste Interior de 2017 pela discussão útil, bem
como aos presentes no meu colóquio no Departamento de Filosofia da Universidade
Estadual da Califórnia, San Bernardino (especialmente Matthew Davidson e Tony
Roy). John Greco forneceu assistência editorial inestimável, pela qual sou
profundamente grato. Também sou grato pelos comentários de dois revisores
anônimos deste periódico. Esses comentários (um conjunto em particular) levaram
à elaboração em pontos-chave da minha discussão e, acredito, tornaram o artigo
melhor. Escrevi este artigo enquanto bolsista lise Meitner na Universidade de
Salzburgo, então agradeço ao FWF (Fundo Austríaco de Ciência) por seu generoso
apoio (número do projeto: M 1881- G24).
1. Para um
relato, veja Witt (2003), (1987).
2. Existem
diferentes noções de individuação. Há a noção metafísica pertinente aqui e uma
epistêmica. A individuação no último sentido é uma conquista cognitiva de um
agente consciente, que ocorre quando esse agente pode discriminar por meio da
percepção ou do pensamento uma determinada coisa entre outras.
3. Veja, por
exemplo, Jaworski (2014); Koslicki (2008), (2006); Johnston (2006); e Fine
(1999).
4. Para um
relato clássico de explicação ao longo dessas linhas, veja Ruben (1990,
especialmente Capítulo 7). Veja, também, Kim (1994, pp. 67–68).
5. Se a e b
estão relacionados R-ly internamente, no sentido de que se a e b existem, eles
devem estar tão relacionados, pode ser plausível negar que haja uma coisa
distinta, R, que os relacione. No que se segue, deixo de lado a questão de se a
relação explicativa, R, é interna ou externa. Manter que não há R porque a e b
estão relacionados (R-ly) internamente exigiria apenas mudar a expressão dos
argumentos seguintes sem afetar suas conclusões.
6. Veja, por
exemplo, Fine (2012) e Rosen (2010).
7. Veja as
citações na nota 3 acima.
8. Veja Van Inwagen
(1990).
9. Para
interpretações mais ou menos ao longo dessas linhas, veja Marmodoro (2013) e
Witt (1987).
10. Pace
Donald Baxter e outros que sustentam que composição é identidade. Veja Baxter
(1988) e Cotnoir e Baxter (2014).
11. Pace
Bliss, uma vez que a existência de uma coisa não pode ser explicada por outra,
não pode haver uma regressão infinita de uma coisa cuja existência é explicada
por outra, cuja existência é explicada por outra coisa, cuja existência é
explicada por outra, etc. Veja Bliss (2013, p. 414). Em seu artigo, Bliss está
tentando apresentar razões para rejeitar certos argumentos para a visão de que
existem entidades fundamentais, a saber, argumentos que envolvem uma regressão
infinita. Meu argumento de que cada coisa é fundamental não é um desses. Bliss
parece assumir que a presença de entidades fundamentais deve ser acompanhada
por uma visão hierárquica da estrutura na realidade. Como fica claro na seção
conclusiva, pode-se aceitar o primeiro e ainda rejeitar o último.
12. Nenhuma
coisa é sustentada em seu ser ou de outra forma feita para ser por alguma outra
coisa. Portanto, a existência de uma coisa per se não pode ser explicada. No
entanto, pode-se explicar como uma determinada coisa veio a ser. Vir a ser é um
fenômeno temporal, que envolve uma coisa em relação a algum(ns) momento(s). O
vir a ser de uma coisa não é, portanto, uma coisa em si; é um fenômeno
estrutural. Explicar como alguma coisa veio a ser é explicar a existência dessa
coisa em algum momento (no qual ela não precisava ter existido) em termos de outras
coisas e suas interações. Se alguém busca uma explicação do vir a ser
simpliciter de uma coisa — por que ela existe, em vez de por que ela existe em
relação a um determinado momento — parece estar negligenciando o elemento
temporal crucial no fenômeno do vir a ser. Na medida em que entendo o tipo de
explicação que está sendo buscada, então, ela parece ser excluída pelo
argumento no texto contra a explicabilidade da própria existência de uma coisa.
13. Para uma
rota diferente para o mesmo relato do que uma coisa é, veja meu “O que é uma
coisa?”.
14. Locke
(1689, iii, iii, 15).
15. De acordo
com Locke, a essência real de um objeto concreto familiar é sua “constituição
interna particular”. É essa constituição interna que supostamente fundamenta
uma explicação de que esse objeto tem suas características observáveis
definitivas e, portanto, é o que é. Veja Locke (1689, ii, XXiii, 3). Veja
Lowe (2008, p. 38).
16. O
essencialismo modal é uma abordagem para entender as restrições ao ser de uma
coisa em termos de características que essa coisa deve ter. Esse é o tipo de
visão que se tornou familiar pelo trabalho de Saul Kripke e Hilary Putnam. O
essencialismo ontológico é uma abordagem para entender as restrições ao ser de
uma coisa em termos da própria existência dessa coisa. Obviamente, é o último
que é adotado aqui. Para as deficiências da abordagem modal, veja Lowe (2008) e
Fine (1995), (1994).
17. Fine
(1995, p. 275).
18. Fine
(1995, p. 274).
19. Fine
(1995, p. 274).
20. lowe
(2008, p. 40).
21. Fine
também aceita essa doutrina. Lowe o cita com aprovação (2008, p. 40).
22. Veja
Sider (2011, Capítulo 2).
23. Veja
Koslicki (2008, Capítulo iX) e, para uma visão semelhante, Jaworski (2014).
24. Veja
Armstrong (1989, pp. 55–56) e Wiggins (1968, pp. 91–92).
25. O termo
vem de Karen Bennett. Veja Bennett (2011) para relatos típicos de tais
relações.
26. É assim
que muitos, incluindo Jonathan Schaffer, entendem a relação de fundamentação.
Veja Schaffer (2009, pp. 378, 379).
27. Veja
Tahko e Lowe (2015) para um relato útil das variedades de dependência
ontológica.
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