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Autor: Emerson Green
Tradução: Pedro Araújo
“Com relação à visão teológica da questão: isso é sempre doloroso para mim. Eu estou perplexo. Eu não tinha intenção de escrever de forma ateísta, mas . . . não consigo me persuadir de que um Deus beneficente e onipotente teria criado intencionalmente as ichneumonidae [vespas parasitas] com a intenção expressa de que se alimentassem de dentro dos corpos vivos de lagartas.” - Charles Darwin


Darwin ficou perturbado com um caso de mal teleológico: o mal teleológico ocorre em virtude do propósito natural de uma coisa. É o sofrimento causado por organismos agindo em conformidade com um ou mais de seus propósitos naturais, ou com seu plano de design. Este não é o problema do design não inteligente. “De forma grosseira”, escreve Felipe Leon, “o problema da disteleologia é o problema do design estúpido; o problema do mal teleológico é o problema do design malévolo.”

A predação é o exemplo mais claro. Predadores com dentes e garras afiados arrancam a carne de suas presas e quebram seus ossos, e frequentemente começam a se alimentar delas enquanto ainda estão vivas. A ordem natural foi projetada de maneira tal que os animais devem, de forma selvagem, matar e devorar uns aos outros para poder sobreviver.

“As pessoas que nos acusam de praticar violência em demasia [deveriam ver] o que deixamos no andar da sala de edição.” - David Attenborough

No contexto dos argumentos do mal, há uma distinção feita entre o mal moral e o mal natural. O mal teleológico é um subconjunto do mal natural, embora ele seja mais difícil de reconciliar do que o mal natural comum:

“O mal teleológico parece ser um problema muito mais formidável para o teísmo do que o mero mal moral ou o mal natural não teleológico. Talvez a razão mais óbvia seja de que, ao contrário do mal teleológico, o mal moral e o mal natural (não teleológico) não envolvem nenhuma presunção clara ou, de outro modo, natural de que tal mal foi pretendido por Deus. . . . Em contraste, quando se trata do mal teleológico, é parte do próprio plano de design e do propósito ou função natural de uma entidade que ela cause o mal. Em tais casos, é natural inferir que, se existe um deus, então faz parte da própria intenção de Deus garantir sofrimento horrendo…” - Felipe Leon

O musaranho-de-cauda-curta-do-norte secreta veneno das glândulas salivares em seu maxilar inferior para paralisar presas. O objetivo da paralisia não é matar a presa, mas mantê-la viva por um período extendido de tempo para permitir alimentação prolongada. O musaranho pode infectar sua presa e então se ocupar dela por dias até que ela eventualmente sucumba aos próprios ferimentos. O musaranho-de-cauda-curta-do-norte não é culpado de transgressão. Ele não é um agente moral. É claro, eu não estou dizendo que predadores são maus; vermes parasitas ou bactérias comedoras de carne também não são. Eles apenas têm os atributos físicos e psicológicos que eles têm na ordem biológica em que se encontram, onde criaturas são colocadas umas contra as outras em uma luta viciosa até à morte que tem durado eras e continuará por eras.

Vastos números de organismos são projetados de maneira tal que não conseguem sobreviver — não conseguem alimentar a si mesmos ou seus filhotes — a menos que matem e devorem uns aos outros de forma selvagem. Ao invés disso, predadores poderiam ter sido necrófagos, ou herbívoros, ou algum outro tipo de organismo que absorve energia sem dilacerar criaturas sencientes membro por membro. Uma quantidade chocante de sofrimento imposta a criaturas sencientes confusas poderia ter sido facilmente evitada se Deus existisse.

Uma coisa é criar algo que pode ser mal utilizado para causar sofrimento. Alguém pode se afogar em uma banheira, mas não é como se a banheira tivesse um propósito ou função malévola. Porém os atributos físicos e psicológicos de um predador são direcionados a dilacerar criaturas conscientes. Não é um subproduto infeliz, ou um uso indevido de alguma habilidade, ou uma perversão da natureza. É como o sistema foi projetado para funcionar.

Então o que devemos pensar desse designer, quem ou o que quer que seja? Tipicamente, naturalistas creem que a evolução por seleção natural é responsável pela forma geral da ordem biológica. Ao contrário de Deus, a seleção natural é um “designer” impessoal e indiferente. Indiferença e amoralidade parecem ser inferências seguras neste caso. Quem ou o que quer que seja responsável pela ordem biológica é provavelmente indiferente e amoral. O que Hume chamou de “a estranha mistura de bem e mal que aparece na vida” é facilmente explicado segundo essa visão. Aqueles que acreditam que o designer é benevolente e perfeitamente amoroso poderiam oferecer algum tipo de explicação da mistura do bem e do mal, assim como aqueles que podem acreditar em um designer malévolo poderiam oferecer algum tipo de explicação da mistura do bem e do mal. Mas a indiferença e a amoralidade seriam mais cabíveis.

Naturalistas tendem a crer que a evolução por seleção natural é primariamente responsável pela ordem biológica. A seleção natural é indiferente e amoral. Por que processos puramente naturais não gerariam ocasionalmente estruturas para agentes não morais direcionadas a produzir sofrimento? Não há nada para o naturalista explicar aqui. Não somos nós que estamos comprometidos em dizer que há algum tipo de justificativa moral por trás do grau, do tipo e da distribuição do sofrimento em nosso mundo. Mas este tipo de mal natural, mais ainda do que o mal natural comum ou o mal moral, quase parece uma desconfirmação direta da ideia de que um ser perfeitamente amoroso e bom é, em última análise, responsável pelo design da ordem biológica.

Não precisamos fazer uma afirmação tão forte. Mais modestamente, poderíamos sustentar que o mal teleológico na natureza — em outras palavras, o design malévolo — é evidência forte contra a hipótese de que a natureza foi projetada, direta ou indiretamente, por um ser insuperavelmente grande de amor e bondade perfeitos.

LEIS NATURAIS MALIGNAS

Isso, até aqui, se baseou primariamente no problema do mal teleológico de Leon. Um argumento distinto, mas relacionado, chega até nós com Quentin Smith em seu artigo de 1991, Um Argumento Ateológico das Leis Naturais Malignas:

Há não muito tempo eu estava dormindo em uma cabana na floresta e fui acordado no meio da noite pelos sons de uma luta entre dois animais. Gritos de terror e agonia extrema rasgaram a noite, misturados com os sons de mandíbulas quebrando ossos e carne sendo arrancada de membros. Um animal estava sendo atacado de forma selvagem, morto e então devorado por outro.

Nunca me foi apresentado um caso mais claro de um evento horrível na natureza, um mal natural. Pareceu-me autoevidente que a lei natural de que animais devem matar e devorar uns aos outros selvagemente para sobreviver era uma lei natural maligna, e que a obtenção dessa lei era evidência suficiente de que Deus não existia.

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