Tradução: Alisson Souza
Autora: Andrea Weisberger
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Um dos problemas mais incômodos na filosofia da religião é a existência do mal moral à luz de uma deidade onipotente e inteiramente boa. Um modo popular de difundir o argumento do mal está no apelo ao livre arbítrio. Tradicionalmente, argumenta-se que existe uma forte conexão, mesmo necessária, entre a capacidade de exercer livre vontade e a ocorrência de irregularidades. A depravação do Transworld, caracterizada por Alvin Plantinga, é um conceito que foi muito longe para explicar essa relação. Essencialmente, a noção de depravação transworld envolve a afirmação de que em qualquer mundo em que uma pessoa seja significativamente livre, essa pessoa, em alguma ocasião, agiria erroneamente, ou como Plantinga frases: "Se S 'fosse real, P iria errado com respeito a A '[1] (onde S' é um mundo possível, P é uma pessoa e A é uma ação). Não só, diz Plantinga, é possível que existam pessoas que sofrem de depravação transworld, mas "é possível que todos sofram". Se a depravação do transworld obtiver, Plantinga observa que Deus poderia ter sido capaz de criar mundos em que o bem moral seja consideravelmente superado pelo bem moral; mas não estava dentro de Seu poder criar mundos contendo o bem moral, mas nenhum mal moral - e isso apesar do fato de Ele ser onipotente ". [2] Nesta visão, Deus não poderia instanciar essências de pessoas perfeitas que nunca pecariam. Embora Plantinga argumenta que esses seres instanciados são significativamente livres na medida em que eles poderiam ter feito de outra forma (ou seja, não pecou), parece que sua reivindicação sobre a depravação transworld equivale a uma reivindicação sobre a existência de uma conexão necessária que se obtém entre a liberdade e o mal. Pois, embora seja sensato alegar que um indivíduo pode ter disposições não actualizadas, reivindicar que todos, passados, presentes e futuros, disposições não-personalizadas parece ser uma reivindicação significativamente diferente. Por conseguinte, é difícil ver como esta última afirmação difere em substância da afirmação de uma conexão necessária que se obtém entre a capacidade de livre-arbítrio e a prática de atos do mal.

No entanto, a alegação sobre a conexão necessária entre liberdade e maldade não é evidente e a incerteza sobre essa conexão aponta para um elo fraco nesta defesa. Uma abordagem alternativa para discutir o livre arbítrio como justificador do mal moral, sem insistir em uma conexão necessária entre livre arbítrio e irregularidade, foi apresentada pelo professor Clem Dore. Dore argumenta que Deus não deve ser visto como reprovável por não intervir nos assuntos dos agentes morais, mesmo que seja possível fazê-lo e permitir que os agentes morais permaneçam significativamente livres.

Embora o argumento de Dore seja bastante interessante, o romance em sua abordagem e digno de consideração séria, não é certo que este argumento esteja livre de reclamações. Será discutido aqui que, após o escrutínio, a posição de Dore realmente precisa superar alguns outros obstáculos. Uma questão que será levantada em resposta à abordagem de Dore é que há uma necessidade de uma representação adequada do que constitui livre arbítrio. Será proposta uma análise alternativa do livre arbítrio, em particular uma definição que enfoca as restrições epistemológicas e não ontológicas. Outro ponto que será abordado diz respeito às relações morais entre Deus e a ordem criada. Será argumentado aqui que essas relações devem ser vistas como dependentes do contexto. Dadas as dificuldades que essas críticas implicam, será demonstrado que a defesa da vontade livre de Dore não é, em última análise, viável.

Dore começa sua discussão sobre a defesa da vontade livre, respondendo ao argumento de Plantinga, o que implica que está além do poder de Deus instanciar as essências pessoais perfeitas (P), pois, de acordo com a depravação transworld, deve ser o caso de uma P em alguns escolha escolher errado. Se Deus fizesse com que um P se abstenha de fazer um erro em uma ocasião, então esse P não seria mais livre para escolher fazer errado (em todas as ocasiões) e, portanto, não seria verdadeiramente uma pessoa perfeita. Dore apresenta a seguinte objeção (que ele observa Plantinga deveria ter considerado). Considere 'X' que denota

a propriedade de ser tal que existem algumas ocasiões nas quais uma tem capacidade de transgressão e sem ocasiões em que de fato faz errado. [3]

Em outras palavras, X permite que haja algumas ocasiões em que uma pessoa pode fazer o que é errado, mas não (além das ocasiões em que uma pessoa realmente não tem a capacidade de fazer o que é errado). Agora, imagine-nos, sugere Dore, uma essência de pessoa instanciada, como Q, que possui X. Q se abstém de se quebrar em algumas ocasiões. Naquelas ocasiões em que se prevê que um Q fará o que é errado, no entanto, Deus poderia impedir que a pessoa instanciada - a essência faça o que é errado e, na verdade, faça com que Q se abstenha de fazer mal. O resultado seria que, de fato, não existem ocasiões em que Q faz errado. Q, portanto, tem a capacidade de fazer o que é errado, mas, de fato, nunca o faz. Q é diferente de P neste último aspecto. Portanto, tudo o que é necessário para se opor a Plantinga aqui é a criação de um Q (Dore chama essa instanciação Jones) que, em algumas ocasiões, é capaz de fazer de maneira errada, mas não. O livre arbítrio é, portanto, preservado, pelo menos em algumas ocasiões, enquanto as irregularidades nunca ocorrem.

Parece, então, que Deus poderia ter instanciado Jones (ou Q essências que possuem X). No entanto, alguém poderia objetar que instanciar Jones é equivalente a Deus, fazendo com que Jones evitem erros em todas as ocasiões, mesmo nas ocasiões em que Jones evitaria livremente a falta. Para evitar esse problema, Dore sugere que Deus poderia instanciar um Q ainda se abstendo de instanciar a propriedade X (de modo que a Q não possesse X) e deixa a Jones apropriar X. Jones então escolheria permitir que Deus evite ações erradas. Desta forma, a possessão de X seria livremente escolhida pelo Jones instanciado. Mesmo se, segundo Dore, Deus fez com que Jones possuíssemos X, isso não é o mesmo que faz com que Jones se abstenha de fazer mal em todas as ocasiões (já que ainda haveria algumas ocasiões em que Jones poderia escolher livremente para evitar transgressões).

Para esclarecer como isso funcionaria, Dore introduz a noção de O-ocasiões, que são ocasiões em que

(i) Jones evita o mal e (ii) nem Deus nem ninguém, além de Jones, são uma causa de o Jones fazer isso. [4]

Jones aqui é diferente de P em que Deus pode fazer com que Jones possua X, impedindo Jones de fazer algo errado em alguma outra ocasião, essencialmente causando ocasiões em que Jones não pode fazer o que é errado. E, segundo Dore, essas essências Q instanciadas são certamente preferíveis para pessoas reais que cometem grandes quantidades de erros. Uma vez que essas essências Q instanciadas, embora desautorizadas em algumas ocasiões de fazerem errado, ainda retem a capacidade de evitar o erro (em virtude de O-ocasiões), eles também retém o livre arbítrio. Assim, é possível que existam pessoas que têm livre arbítrio, mas nunca, de fato, cometeram ações erradas (desde que um Q possua X e atue em O-ocasiões). Se esta objeção à depravação transworld de Plantinga estiver em pé, então existe uma verdadeira questão de por que Deus não criou Q que possui X em vez de pessoas reais, já que agora parece que o livre-arbítrio pode existir na ausência do mal.

No entanto, a intenção de Dore aqui não é desacreditar a defesa da vontade livre, mas defender Deus contra a acusação do argumento do mal, argumentando finalmente por uma visão que liga a vontade livre com a ocorrência do mal (embora isso não seja um link necessário). Assim, respondendo ao exemplo de Jones que foi construído como uma objeção à defesa da vontade livre tradicional, Dore observa que "essa objeção aparentemente formidável pode ser atendida, embora de uma maneira que nos leva além de Plantinga". [5] Ao especificar as duas opções a seguir, a Dore prossegue para mostrar as falhas em sua objeção prévia. A primeira opção é a seguinte:

Ou O-ocasiões são tais que Deus teria intervindo nessas ocasiões para impedir que Jones fizesse o erro, se ele tivesse previsto (o que é contrário ao fato) que Jones faria mal nessas ocasiões, exceto a intervenção de Deus, ou Deus não teria interposto . [6]

Se Deus interveio, Dore ressalta, então

Mesmo que as O-ocasiões sejam aquelas em que ninguém, além de Jones, faz com que Jones ignore os erros, O-ocasiões, no entanto, não serão ocasiões em que Jones tenha capacidade para fazer mal. Se é verdade que um ser onipotente teria interposto para impedir que Jones fizesse algo errado em algumas ocasiões, O1, caso contrário, Jones teria feito errado em O1, então Jones não tinha nenhuma opção real em relação a ações erradas O1: ele não poderia ter feito senão evitá-lo. [7]

Então, se Deus estivesse disposto a intervir, Dore afirma, Jones não poderia ter feito o contrário. E, uma vez que outras ocasiões em que Jones evita erros podem ser bem vindas às mesmas circunstâncias, é difícil ver como Jones possui X. [8]

Dada esta situação, Dore propõe a segunda opção, na qual Deus não intervém.

Suponhamos, então, que O-ocasiões, são tais que, se Jones tivesse se envolvido em ações erradas nessas ocasiões, exceto a intervenção de Deus, Deus não teria interposto para impedir que Jones se desviasse pela moral. [9]

Deveria ser claro neste momento, diz Dore, que qualquer disposição para intervir pela parte de Deus durante uma O-ocasião privaria Jones de livre arbítrio, uma vez que O-Sometimes é, por definição, necessário preservar o livre arbítrio na Q que possui X. O Jones de Dore difere aqui da essência da pessoa perfeita (P) de Plantinga, na medida em que, em virtude da propriedade X e O-ocasiões, não ocorre nenhuma transgressão. Considerando que, de acordo com a depravação transworld, um P, em algum momento, escolhe se desviar. O que Dore está preocupado aqui é a disposição de Deus para intervir se, ao contrário do fato, Jones escolheria fazer o que era errado. Assim, Dore argumenta, dada a definição anterior de O-ocasiões, a falta de disposição de Deus para intervir é necessária para preservar o livre arbítrio, mesmo que Jones seja, ao contrário, de cometido errado. E, se Jones erasse em alguma O-ocasião, ao contrário do fato, Dore sustenta que não devemos ver Deus como reprovável por não ter intervindo. Além disso, Dore argumenta, se não vemos Deus como reprovável por não ter disposição para intervir nas ocasiões em que Jones evita livremente o mal cometido, também não devemos ver Deus tão reprodutível por não ter disposição em intervir nas ocasiões em que Jones surpreende todos e não resulta ser a instanciação de Q. Em outras palavras, Dore quer manter a falta de disposição de Deus para intervir em assuntos mundanos (para evitar erros) não é reprovável. Como Dore argumenta:

... não há diferença moralmente relevante entre as ações que Deus teria desempenhado em O-ocasiões quando Jones livremente evita erros (ou seja, ações de permitir que Jones faça o que está errado) e as ações que Deus realiza em ocasiões quando em fato de Jones se envolver em ações erradas (ou seja, também ações de permitir que Jones se perca pela moral). [10]

Dore conclui que este suplemento à resposta incompleta de Plantinga à questão de por que Deus não instancia apenas as essências P mostra porque Deus não é reprovável. Deus não pode ser encarado como reprovável por não criar instâncias apenas em essências Q, pois a mera ausência de disposição para intervir não deve ser um foco de culpa. E mesmo que Deus fosse apenas instanciar as essências Q, Deus ainda teria que permitir uma transgressão se esses seres, ao contrário do fato, assim escolhessem. No entanto, uma pergunta parece permanecer: "Por que Deus não conseguiu instanciar apenas aquelas essências Q que estava previsto, de fato, não faria mal?" Eu vou voltar para a resposta de Dore a este problema mais tarde, ao examinar as tentativas de Dore de encontrar objeções à sua versão da defesa da vontade livre.

Não satisfeito com o estado atual da justificação do status moral proposto de Deus, Dore apresenta uma explicação adicional sobre o motivo pelo qual Deus não deve ser rotulado como reprodutível por não criar instâncias apenas o que equivale a essências pessoais perfeitas. E isso, diz Dore, permite ao teísta dispensar o argumento de Plantinga.

Considere uma determinada essência de pessoa perfeita, P. Se a instanciação de P (chamá-lo de "Smith") tivesse feito algo errado em uma determinada ocasião, O, então, "P não teria sido instanciado" implica "Se Smith tivesse ia fazer errado em O, então ele não teria existido então ". E é claramente falso que uma pessoa pode ser capaz de fazer algo assim, se ele fosse fazer isso, então ele não teria existido: a existência é uma condição necessária para que uma pessoa realize qualquer ação e, como fortiori, é necessário condição de uma pessoa ter o seu poder para realizar qualquer ação. [11]

Dore observa que não é mais aceitável afirmar que "Smith poderia ter feito errado em O, mesmo que Smith tivesse escolhido fazer errado em O, ele não teria sido criado" do que afirmou que "Smith poderia ter nadado em O , mesmo que Smith tivesse escolhido nadar em O, não teria havido líquido para Smith nadar ".

No entanto, pode-se objetar que Deus, sendo onisciente, poderia prever que algumas instanciações escolheriam livremente fazer apenas ações corretas e prever que outros escolheriam se desviar. Dore reconhece que seu argumento não implica isso

Deus não poderia ter atualizado as essências de pessoas que de fato, se atualizadas, tiverem desempenhado livremente ações de abster-se de ações erradas e nunca teriam realizado ações erradas. [12] (Italics mine)

Mas, Dore continua,

dado que o defensor do livre arbítrio está certo ao afirmar que um mundo em que as criaturas de Deus freqüentemente evitam livremente o mal é melhor que qualquer mundo em que não haja evasão gratuita de erros, o que mostra que Deus teria sido moralmente justificado por não ser disposto a impedir o erro de instâncias de personagem perfeita se (ao contrário do fato) ele previu que, às vezes, eles faziam errado. [13]

Em suma, Dore argumenta que Deus é liberado da acusação de repreensibilidade, uma vez que não há diferença moralmente relevante entre a incapacidade de Deus de estar disposta a intervir em relação (ou mesmo permitir a instanciação) de essências perfeitas que poderiam (ao contrário do fato ) faz errado e Deus está permitindo a instancia dos malfeitores que, de fato, existem.

Alguns comentários estão em ordem neste momento. Em primeiro lugar, deve notar-se que a definição de O-ocasiões de Dore estipula que Jones, na verdade, evita erros. Se quisermos usar uma O-ocasião genuína como exemplo, dado que a definição de O-ocasiões de Dore inclui a evasão de irregularidades (sem a participação de Deus ou de qualquer outra pessoa além de Jones), então a questão da disposição de Deus para intervir pode ser tornada supérflua. Ou seja, não há necessidade de tal disposição quando Jones, de fato, evite o mal. Não apenas as O-ocasiões, tal como definidas por Dore, desautorizam a intervenção de Deus por definição, mas também parecem tornar essa disposição desnecessária (para que significado é uma disposição intervir se a intervenção divina é descartada?). [14]

Em segundo lugar, e talvez mais importante, uma distinção útil pode ser feita entre "escolher livremente para fazer X" e "fazer livremente X". Parece que Dore quer argumentar que o livre arbítrio consiste na capacidade de fazer algo no mundo (ou seja, desviar-se). No entanto, também parece razoável argumentar que tudo o que é necessário para a preservação do livre arbítrio é a livre escolha para cometer um ato. Considere o seguinte cenário. Digamos que Dolan se propõe a assassinar Adams. Dolan criou um plano no qual Adams será assassinado à meia-noite através de um único tiro ao templo. Todos os detalhes horríveis da morte de Adams foram decididos livremente por Dolan, que está apenas esperando o tempo escolhido para realizá-los. Diante disso, parece justificado assumir que Dolan tem livre arbítrio. Não parece necessário que Dolan, de fato, assuma Adams por essa atribuição de livre arbítrio. Se, talvez, Deus pudesse intervir no momento do assassinato e Adams, apesar de parecer morto, não foi de fato prejudicado, o livre arbítrio de Dolan não teria sido violado.

Pode-se opor-se a isso ao notar que, se suficientes de nossas ações erradas, escolhidas livremente, fossem manipuladas dessa maneira, durante um período de tempo, não mais nos incomodaríamos de optar por erradicar a moral e, portanto, nossa capacidade de livre vontade sofreria. Em resposta, no entanto, uma série de opções podem ser especificadas. Por um lado, poderia ser o caso de Deus permitir que Dolan continue a pensar que Adams foi de fato assassinado, embora Adams permaneça muito vivo. Por exemplo, Adams poderia ser deslocado e assumir uma nova identidade, bem como o que acontece em um programa de proteção de testemunhas. Adams seria incomodado, mas não morto, e o livre arbítrio de Dolan seria mantido. Dolan poderia então voltar sua atenção para assassinar Jenkins. Ou, Deus poderia permitir que Dolan começasse o que parece ser um assassinato, tudo de acordo com os planos de Dolan, preservando a vida de Adams e apagando toda a lembrança da ação covarde da mente de Dolan. Dolan poderia então ser livre para criar outros planos assassinos, cujos resultados seriam semelhantes. Em outras palavras, Deus poderia intervir nos casos em que se opta por não permitir que as ações de alguém sejam eficazes (embora pareçam ser) ou, assim, apagando a memória do ato depois de terem sido escolhidas . Ao fazê-lo, Dolan manteria a livre escolha, mas não poderia instanciar essa escolha (sem o conhecimento de Dolan). E, se Deus pudesse preservar o livre-arbítrio dessa maneira, ao mesmo tempo que evita que haja ocorrências reais, mas não, a inocência de Deus é questionável.

Uma objeção óbvia a esta imagem é que sugere um mundo cheio de ilusão. Em outras palavras, o teísta seria altamente desconfortável com a idéia de que Deus, para evitar a acusação de repreensibilidade, é feito para ser enganador, em princípio. E, além disso, um Deus tão enganador não parece cumprir a exigência de ser "totalmente bom". Em resposta, basta observar que, se Deus deve se abaixar ao engano para preservar o livre arbítrio, talvez isso seja menos repreensível do que ficar parado, enquanto os indivíduos sofrem e morrem (em uma tentativa correlativa de preservar o livre arbítrio). Deve lembrar-se de que vivemos em um mundo cheio de sofrimento, um mundo no qual crianças inocentes e criaturas impotentes vivem rotineiramente vidas inteiras de fome, medo e horrível ferimento produzido por guerras sobre a posse de território ou adesão à ideologia. Mais de 60 milhões de criaturas morrem mortes desagradáveis ​​nos laboratórios médicos apenas nos Estados Unidos a cada ano. Este é um mundo em que a minoria das criaturas sensíveis vive agradavelmente e em que a fome é uma possibilidade real para dezenas de milhões de habitantes humanos.

Além disso, o link deve ser fortemente feito entre engano e repreensibilidade, uma vez que não é claro que todo o engano é assim classificado; algum engano pode ser admirável nos seres humanos (por exemplo, mentir para o nazista na porta para saber se você está escondendo um judeu).

Por outro lado, se nós concedemos que um mundo que contenha livre-arbítrio e maldade seja melhor do que um mundo sem o mal e sem livre arbítrio (ou apenas a aparência do livre arbítrio), então não poderíamos, é claro, manter Deus repreensível para permitindo o mal, mesmo que, de fato, o mal esteja necessariamente ligado ao livre arbítrio. Dore parece argumentar que, dado o valor do livre arbítrio, Deus não é reprovável, e, além disso, que não precisa haver uma conexão necessária entre o mal e o livre arbítrio, uma vez que é concebível que Deus possa instanciar pessoas que nunca, de fato, fazem errado.

No entanto, é concebível, contra Dore, que exista um mundo em que haja liberdade de escolha, mas não a possibilidade de, de fato, fazer errado, tal como explicado no exemplo de assassinato de Dolan-Adams. Além disso, é concebível que haja liberdade de escolha, mas não a possibilidade de mesmo escolher fazer o que é errado, como em um mundo no qual apenas as opções de realizar ações neutras, boas e supere rogativas estavam abertas a agentes morais. Não é claro que a possibilidade de escolher o mal moral é necessária para a livre escolha, assim como a gama completa de 31 sabores não é necessária para que um escolha sorvete de chocolate. Em tal mundo, o louvor moral seria atribuído com base em que tipo de ato é escolhido (bom ou supererrogatório) e nenhuma culpa seria atribuída à escolha neutra.

Parece, então, que, de acordo com a visão de Dore, a falta de uma disposição divina para instanciar (o que parece ser) uma essência de pessoa perfeita que, ao contrário, faria mal, destrói a livre escolha dessa pessoa. O argumento de Dore baseia-se na afirmação de que a pessoa-essência em questão não poderia fazer de outra forma em uma determinada ocasião, ou fazer qualquer coisa em qualquer ocasião, porque essa pessoa-essência não seria instanciada. Assim, Dore argumenta, Deus não deve estar disposto a deixar de criar uma pessoa perfeita se, ao contrário do fato, essa instanciação fará o que é errado, assim como Deus também não deve estar disposto a deixar de instanciar ninguém, por sua própria razão fazendo errado, senão toda liberdade humana seria eliminada em virtude do fato de que ninguém existiria. O livre arbítrio é preservado, ao que parece, apenas na ausência de tal disposição divina.

No entanto, novamente, Dore admite que é plausível para Deus criar pessoas perfeitas que sempre façam o que é certo. O que está sendo reivindicado aqui é que não há diferença moralmente relevante entre a disposição de Deus para instanciar aquelas essências da pessoa perfeita que, ao contrário do fato, fizerem o erro e a disposição para instanciar as essências da pessoa comum que de fato fazem o que é errado. E, se Deus só estivesse disposto a instanciar essências de pessoas perfeitas que na verdade não fazem nada errado, então essas criaturas não seriam livres, pois não poderiam ter feito o contrário. Em outras palavras, se Deus pregava que essas essências pessoais, ao contrário do fato, fariam errado e que Deus estava disposto a não instanciá-las, então elas não podiam fazer o que era errado (já que não existiriam). Portanto, se Deus escolheu apenas instanciar, de fato, essências pessoais impecáveis, diz Dore, não poderiam ter feito o contrário e, como resultado, não são livres.

A afirmação de Dore de que a liberdade consiste na capacidade de fazer de outra forma também pode ser questionada a este respeito. A discussão anterior do livre arbítrio investigou a escolha e a eliminação de obstáculos à ação como constituição de vontade livre de boa fé. Na mesma linha, pode-se argumentar que é mais do que apenas a incapacidade de fazer de outra forma, o que limita a livre escolha; Em vez disso, é o conhecimento de sua incapacidade de fazer de outra forma, o que limita nossa liberdade. Se, como no exemplo que Locke apresenta, [15] alguém, diga Smith, estava em uma sala onde, sem o conhecimento dela, as portas estavam acorrentadas de fora para que a fuga fosse impossível, e Smith decidiu ficar naquela sala, então Parece que seu ato foi escolhido livremente. Se, por outro lado, ela decidiu sair da sala e descobriu a porta trancada então, nesse ponto, o restante na sala não teria sido escolhido livremente. Em ambos os casos, ela não poderia ter feito o contrário. Um caso semelhante é apresentado por Harry Frankfurt. [16] No exemplo de Frankfurt, uma pessoa, Black, tem o poder de forçar Jones a fazer algo e está disposta a fazer com que Jones cometer esse ato se Jones não decidir fazer isso por conta própria, mas Black preferiria que Jones decidisse livremente para cometer esse ato em questão. Mesmo com todas essas restrições, se Jones cometeu o ato em questão, sem qualquer intervenção na parte de Black, Jones já fez isso, mesmo que Jones não pudesse ter feito o contrário. Em ambos os casos, a livre escolha, não depende da capacidade de fazer de outra forma, mas do conhecimento relevante disponível sobre a situação. Claro que se, em ambos os casos, Smith e Jones estivessem cientes de suas respectivas restrições e que, portanto, não pudessem fazer o contrário, não seriam capazes de optar por fazer de outra forma porque saberiam que poderiam escolher. Ao escolher livremente para cometer um ato, a avaliação de uma determinada situação parece crucial. O conhecimento das restrições é necessário para essa avaliação. Analogamente, mesmo que existissemos em um mundo em que não havia a opção de cometer males hediondos, não devemos dizer que ninguém pode optar livremente por agir. Assim, mesmo que fosse o caso que, em nosso mundo, nenhum de nós poderia fazer de outra forma, por causa de alguma força sobrenatural desconhecida, ainda devemos afirmar que nossas escolhas eram gratuitas desde que permanecêssemos inconscientes dessa restrição extraordinária. Se é razoável supor que esta restrição não existe, então é razoável assumir que nossas escolhas são gratuitas. (E no nosso mundo, é razoável que assumamos que essa restrição não existe). Da mesma forma, é razoável que Smith e Jones assumam que as restrições, como as que estavam sobre elas, não existem. Portanto, é razoável acreditar que tanto a Smith quanto a Jones escolheram livremente executar as ações especificadas.

Em todos os casos acima, a capacidade de fazer alguma escolha é deixada intacta. A escolha em si é então julgada como livre ou não à luz do conhecimento ou falta de conhecimento da restrição. Se Smith escolheu sair da sala, levantou-se de sua cadeira e encontrou escapar impossível, sua escolha anterior para sair não seria então liberada. Pois a escolha própria foi feita à luz do conhecimento prévio da situação. Sua incapacidade subseqüente de realizar essa ação que ela escolheu não mudaria o status de sua escolha anterior. Da mesma forma, se Jones decidiu não fazer o que Black desejasse e Black, então o obrigou, o status da escolha anterior de Jones permanecerá inalterado. Jones não seria culpado, se o ato estava errado, e Smith também, se o resultado de sua prisão levou a ela a não conseguir cumprir outras obrigações. No entanto, ambos seriam louváveis ​​se suas escolhas, feitas sem conhecimento da restrição, levassem a algum bem previsto. Isto é assim porque as restrições, em ambos os casos, não infringem a respectiva capacidade de escolher.

Pode-se afirmar que, apesar de Smith e Jones serem justificados em acreditar que sua escolha e ação posterior são livres, o fato de que eles não estão conscientes de fatores ocultos que realmente restringem suas escolhas fazem com que não sejam, de fato, livres. E, o objetor pode continuar: "simplesmente dos fatos sobre o que é razoável que um agente acredite, não podemos inferir o que seria razoável para um terceiro, quem sabe todos os fatos da situação sobre o agente, para acreditar '. Em resposta, primeiro deve notar-se que os fatores ocultos nesses casos restringem ações, não a escolha. Por exemplo, se eu escolher tentar o vôo, o fato de que eu não posso voar, não importa o quão difícil eu abotoe meus braços, significa que minha escolha não foi gratuita? Em segundo lugar, um dos "fatos da situação sobre um agente" é o estado epistêmico do agente. Parece perfeitamente razoável alegar que se pode escolher livremente sem poder agir, e é isso que parece suficiente para a atribuição do livre arbítrio. Afirmar que o livre-arbítrio depende de fatos que pertencem à ação é implorar a questão: precisamente o que está em causa é se a "vontade livre" deve se referir a "ser capaz de fazer de outra forma" ou "poder escolher de outra forma". Parece que o último (o epistêmico, e não o ontológico), o "livre arbítrio" é ao menos tão plausível como o primeiro. Na verdade, nós continuamente escolhemos buscar metas que talvez nunca aconteçam. Mas isso não significa que nossas escolhas não fossem gratuitas simplesmente porque desconhecemos o resultado final. O exemplo discutido acima destina-se a destacar isso, a saber: "Um pode escolher livremente permanecer em uma sala da qual não se sabe que, de fato, não há escape?" Claro. Foi exercido livremente aqui? Isso depende, em última análise, da definição de livre vontade adotada. O argumento avançado aqui é que, pelo menos, de acordo com uma alternativa, e parece ser viável no discurso comum, a livre escolha é uma manifestação do livre arbítrio. Afirmar que a livre escolha não é equivalente ao livre arbítrio nestes exemplos levanta a questão em favor de uma definição ontológica e não epistêmica. O onus é então sobre aquele que nega que esta seja uma conta adequada para mostrar o porquê.

Agora podemos retornar à afirmação de Dore de que, se Deus instanciasse apenas essências de pessoas perfeitas, porque estava previsto que eles sempre escolheriam evitar as irregularidades, isso resultaria na eliminação de sua livre escolha, uma vez que não poderiam ter feito o contrário ( senão eles não existiriam). Se o argumento acima que a escolha livre não inclua "ser capaz de fazer de outra forma", mas sim inclui "ser capaz de escolher o contrário" é correto, então podemos ver como Deus pode ser visto por alguns como reprodutível por não instanciar apenas tão perfeito - essências da pessoa e, assim, eliminando o mal moral. Para a restrição que Dore vê aqui em termos de Deus, desconsiderando erros é análogo ao constrangimento Smith e Jones estão abaixo, isto é, que essas pessoas perfeitas não saberiam que não poderiam fazer o contrário e, portanto, todas as suas escolhas seriam gratuitas. O fato de que eles sempre escolhem evitar o mal e que essa situação se obtém em virtude de uma disposição divina, de modo algum limita sua capacidade de fazer tais escolhas. Enquanto essas pessoas perfeitas não conhecem o constrangimento e enquanto a capacidade de escolha for mantida, a disposição de Deus de deixar de instanciar qualquer pessoa - essências que, está previsto, farão o mal não eliminam essas pessoas perfeitas 'capacidade de escolher livremente. Parece como se a "objeção formidável" que Dore criou contra Plantinga no exemplo de um Q possuindo X ainda é viável.

E parece que Dore também deve ter considerado a seguinte objeção em relação à culpa moral divina pelo mal. Ou seja, mesmo que não haja diferença moralmente relevante, no nível divino, entre a disposição para permitir que as pessoas perfeitas escolham o mal, contrariamente ao fato, e a disposição para permitir que as pessoas reais optem livremente por fazerem errado, parece haver uma diferença moralmente relevante em relação a essa ação no nível humano. Se, por exemplo, Garcia diz a Davis de um plano para escolher livremente um ato hediondo que prejudicará um terceiro e Davis está disposto a não intervir (nem inibindo Garcia de agir ou advertindo o terceiro para cuidar e evitar o plano de Garcia), então Davis pode ser dito cúmplice e, como resultado, moralmente reprovável. Se, por outro lado, Garcia informasse Davis de um plano para fazer um excelente serviço ao terceiro, ou para evitar que esse terceiro se perca, Davis está disposto a não intervir não parece reprovável, no mínimo. A disposição de Davis de não intervir, em termos de disposição, é a mesma em ambos os casos. No entanto, não é a falta de intervenção simpliciter, da parte de Davis, que é julgada repreensível, mas a falta de intervenção em um contexto. É por isso que consideramos a disposição de Davis de não intervir repreensível no primeiro, mas não no último caso. A disposição para não intervir não é julgada como uma disposição, mas como uma disposição para não intervir em um contexto.

O problema é que essa distinção se intensifica quando extrapolada para Deus. Se Deus é onisciente, há sempre uma "adivinhação" do que o ato de um indivíduo, de fato, implicará e pretende. Se Deus souber que Hitler vai matar 9 milhões de pessoas, ou que Ceacescu manterá uma nação apravista e, no entanto, está disposto a instanciar Hitler ou Ceacescu, permitindo que eles escolham livremente o mal, então isso é significativamente diferente de estar disposto a instanciar a Madre Teresa ou Harriet Tubman, de quem é "conhecida" que eles escolherão livremente para evitar e se opor ao mal. Aqui, a disposição de Deus de não intervir, em termos de disposição, é a mesma coisa. Se a disposição de Deus não intervir para evitar que a Madre Teresa cometa transgressões, contrariamente ao fato (preservando assim a vontade livre), não é reprovável, então, de acordo com a análise de Dore, não deve ser reprovável quando aplicado a Hitler. No entanto, pode-se argumentar, no que diz respeito ao caso anterior de Hitler e Ceacescu, que Deus é tão cómplice quanto Davis foi a Garcia. Em outras palavras, embora a disposição para a não-intervenção simpliciter possa ser a mesma em ambos os casos, o valor moral do agente nesse caso, e talvez o valor dos agentes em relação à maioria dos casos, seja determinado por outras circunstâncias. A presciência de Deus é um elemento poderoso nessas circunstâncias determinantes.

Dore, no entanto, se depara com uma possível possível oposição ao seu argumento. O crítico, observa Dore, pode afirmar que seu argumento "prova demais":

Para isso, "prova" que Deus não teria sido reprovável por instanciar apenas as essências pessoais que fizeram escolhas moralmente erradas, mas nunca moralmente corretas, apesar de ter capacidade para fazer as últimas escolhas. Dore está comprometido com esta conclusão por sua afirmação de que, se Deus não fosse reprovável por não estar disposto a evitar escolhas erradas que não são feitas de fato, ele não é reprovável por não impedir escolhas erradas que de fato são feitas. Para essa afirmação (chamá-lo de "L") não implica que exista uma certa porcentagem de escolhas corretas no número total de escolhas gratuitas, certo e errado: L é perfeitamente compatível com a ausência de tal porcentagem. [17]

Dore contesta o objetor alegando que existem, de fato, uma série de escolhas moralmente corretas. Seu argumento, ele ressalta, começou por investigar se Deus seria reprovável ao não estar disposto a impedir uma escolha moralmente errada, mesmo que não ocorresse, o que era contrapartida a uma ação correta e livremente escolhida. Assim, pressupõe-se que algumas ações certas escolhidas livremente ocorrem, e L implica que existam algumas delas. No entanto, Dore admite que L não explica por que é necessário que haja um ou mais casos em que ações corretas escolhidas livremente aconteçam. O que é necessário é um suplemento a L que afirma que existe uma diferença moralmente relevante entre a disposição de Deus em relação à não intervenção em relação a um mundo em que as ações erradas, escolhidas livremente, superam bastante as ações certas escolhidas livremente e a disposição de Deus em relação à não intervenção em um mundo em que as coisas são de outra forma. Além disso, argumenta Dore, o defensor do livre arbítrio não precisa especificar a porcentagem de ações corretas livremente escolhidas necessárias entre o número total de ações livremente escolhidas para que não haja diferença moralmente relevante, mas só precisa "afirmar que a porcentagem não é negligenciável". [18] Sobre como o defensor do livre-arbítrio é para apoiar esta afirmação, Dore permanece em silêncio. E parece igualmente plausível para os não-religiosos, especialmente um não-seisista que existe fora de uma sociedade privilegiada como a nossa, para fazer a afirmação de que essa porcentagem é negligenciável.

A suspeita de Dore sobre a solidez dessa resposta à questão de por que é preciso escolher livremente ações moralmente corretas resulta na apresentação de outra objeção:

Ligue para a porcentagem prevista (seja o que for que seja) 'P'. Agora, ex hipótese, Deus não permitiria que a porcentagem de ações de direito livre cai abaixo de P. Portanto, nenhum agente moral dado, M1; tem uma capacidade para trazer o nível de ação errada gratuita até o ponto em que a porcentagem de ações de direita livre cai abaixo de P. Vamos chamar um candidato para essa ação de violação de P, 'A1'. Uma vez que, ex hypothesi, Deus impediria A1, M1 não poderia se abster de violar P. E exatamente, considerações semelhantes se aplicam ao próximo candidato para que M1 se abstenha livremente de realizar a ação de violação de P, A2, e assim também para a próximo candidato, A3; e assim por diante, até chegarmos à conclusão de que a capacidade putativa de M1 de se abstenha livremente de uma transgressão é de fato inexistente. [19]

Dore propõe, em resposta, que pode haver agentes homólogos equivalentes que realizam ações de restauração de P para cada agente moral que executa uma ação violadora de P. No entanto, Dore reconhece que, se M2 (um agente moral que opte livremente por executar uma ação restauradora de P) absteve-se dessa atividade, isso equivaleria a realizar uma ação violadora de P. E o argumento usado contra o M1 poderia então ser aplicado ao M2, de modo que, em algum momento, deixasse de ser o equilíbrio desejado das ações certas escolhidas livremente sobre os errados escolhidos livremente. Para se salvar do objetor, Dore acrescenta:

O que é indicado, então, é a postura de um número indefinidamente grande de agentes morais compensadores. Este movimento, obviamente, seria um tanto ad hoc se não tivéssemos motivos para acreditar que Deus existe e quereria que algumas de suas criaturas sejam agentes morais livres. Mas na verdade, temos motivos para acreditar nisso. [20]

Dore refere-se a um argumento anterior (O) para a existência de Deus para salvar a defesa da vontade livre desta última objeção. No entanto, o movimento ainda parece ad hoc, uma vez que o que está em questão na defesa da vontade livre é a existência de um Deus totalmente bom, onipotente e onisciente. Se, de fato, o argumento de Dore (O) para a existência de Deus for bem-sucedida, então a defesa da vontade livre é supérflua, pelo menos até Dore, uma vez que (O) pretende estabelecer a existência de tal Deus. [21]

Há uma última pergunta que, diz Dore, o defensor do livre arbítrio precisa responder:

Dado que o valor das escolhas e ações virtuosas gratuitas é suficientemente grande para superar o valor negativo de escolhas e ações imorais e prejudiciais, por que, se fosse o caso, em relação aos seres humanos, é freqüentemente moralmente admissível - e, de fato, obrigatório - impedir que as pessoas causem grandes danos? Se Deus prometeu intervir em relação a criminosos graves, então, como pode ser correto para os seres humanos fazê-lo? [22]

Dore responde afirmando que, se Deus interveio sempre naqueles casos em que ocorreria uma irregularidade, então o livre arbítrio seria abolido. E, como os humanos não têm o poder de intervir continuamente, os humanos também não têm o poder de abolir o livre arbítrio.

No entanto, ainda pode ser perguntado se Deus é justificado em permitir que indivíduos, como Hitler, cometer crimes tão hediondos e danos resultantes. A resposta de Dore a esta é duas partes:

... a) que não há diferença moralmente relevante entre o fracasso de Deus para evitar o prejuízo que os bilhões de infractores comuns cometem e a falha em impedir o prejuízo causado por indivíduos tão monstruosos como Hitler e (b) que não temos motivo para acreditar que Deus deve reduzir consideravelmente o número de agentes morais que habitam o universo, uma vez que não temos motivos para acreditar que o fato dele não diminuir substancialmente a porcentagem de ações diretas livres no número total de ações livres, certo e errado. [23]

Mas certamente mesmo Dore deve admitir que existe uma grande diferença moral entre Hitler e um malfeitor comum, mesmo entre um Hitler e aquele que comete um assassinato. Se for esse o caso, a não intervenção de Deus em relação a um malfeitor comum e a um Hitler é moralmente significativa. E, é a relação de Deus com o indivíduo que julgamos, bem como as ações de Deus em relação a toda a existência. Além disso, parece que uma diferença moralmente relevante pode ser observada entre um Hitler e um bilhão de infractores comuns, uma vez que o malfeitor comum entre nós não comete nem mesmo homicídio. Assassinato ou tortura não é um crime comum, uma vez que a grande maioria vive vidas cometem ações erradas que não incluem crimes de tal intensidade. No entanto, é difícil ver como uma reivindicação pode ser feita para qualquer dos lados, seja ou não um bilhão de ações erradas comuns equivalem a ações erradas de Hitler, uma vez que este é um assunto empírico difícil de quantificar. No entanto, em relação aos indivíduos, parece haver uma grande diferença entre um assassino comum, por exemplo, e um Hitler.

No que diz respeito à questão de saber se temos ou não motivos para acreditar que a diminuição do número de pessoas diminuirá as ações erradas e aumentará a porcentagem de ações diretas livres sobre ações erradas, parece que temos motivos para acreditar na resposta afirmativa. Se Deus seja onisciente, parece que aqueles (como Hitler) poderiam ser eliminados resultando em uma situação em que haveria um aumento no equilíbrio do direito sobre ações erradas. Em outras palavras, se Deus acredita ser onisciente, então há razões para acreditar que uma diminuição seletiva da humanidade poderia criar um mundo melhor. [24]

Uma última observação está em ordem quanto à afirmação de Dore de que a constante intervenção de Deus aboleria o livre arbítrio. Imagine um mundo idêntico ao presente, exceto que os seres humanos são dotados de um poder especial que não possui atualmente. Esse poder permitiria que qualquer um presenciasse a comissão de um ato maligno para evitar o dano resultante. Por exemplo, qualquer pessoa preso a um assassinato, qualquer um em um campo de concentração, qualquer pessoa que testemunhe uma situação em que o dano venha a outro, pode impedir que ocorram danos, tornando ineficazes as ações do atacante. O mal só poderia ser evitado se uma testemunha escolhesse livremente usar esse poder e esse poder não poderia, por sua natureza, ser usado para danos (seria ineficaz). As pessoas ainda poderiam continuar a cometer ações malignas, eles simplesmente teriam que fazê-lo em privado em vítimas inocentes. Os males em larga escala, no entanto, como em campos de concentração e guerras, seriam improváveis. Além disso, uma vez que o uso desse poder seria uma questão de escolha, o livre arbítrio de ninguém seria violado, pelo menos não de forma a que o defensor do livre arbítrio se debruçasse.

A questão agora pode ser colocada: por que Deus não poderia ter instilado esse poder em humanos, impedindo assim pelo menos uma grande quantidade de maldade no mundo hoje? Tal situação não implicaria a intervenção constante ou mesmo ocasionais de Deus em assuntos terrenos e, portanto, o problema de limitar o livre arbítrio não surgiria. Se Deus pudesse ter feito isso (e não parece inconcebível ou logicamente impossível que tal coisa possa ser alcançada por um ser onipotente), mas optou por não fazê-lo, então Deus é reprovável por não diminuir alguns dos maldades do mundo. À luz deste experimento de pensamento, parece que há um mal que é evitável e evitável de uma maneira que não limita o livre arbítrio.

Sem dúvida, pode-se afirmar que a concessão deste poder é arbitrária e, se isso for permitido, então sempre pode ser perguntado por que Deus não concedeu um poder ainda maior para eliminar o mal. Devemos notar que o defensor do livre arbítrio pode argumentar que, em algum momento, um poder de magnitude suficientemente grande eliminaria a vontade livre (ou seja, um poder igual à intervenção constante de Deus). Podemos então concordar que Deus não poderia conceder um poder tão grande, proporcionando assim um ponto de corte. Mas parece que o rótulo de arbitrariedade pode ser anexado às habilidades que atualmente desfrutamos. Não parece haver necessidade em uma pessoa com força suficiente para intervir e prevenir um assassinato, uma agressão ou uma violação, e outra não sendo capaz de fazê-lo. Parece arbitrário também que os estupradores podem dominar suas vítimas na maior parte do tempo. A objeção da arbitrariedade ainda não excusa Deus da repreensibilidade nem justifica o estado de criaturas livres.

Em conclusão, os argumentos de Dore para libertar Deus da culpa moral pela existência do mal, com base na preservação do livre arbítrio, não parecem finalmente viáveis. A afirmação de que o fracasso de Deus em intervir nos casos em que o grande mal poderia ser evitado é justificada com base na preservação da vontade livre, carece de credibilidade dada uma interpretação do livre arbítrio em termos de restrições epistemológicas e não ontológicas. E, se examinarmos a análise de Dore sobre a falta de disposição divina para intervir em vários casos, não parece que todas as situações sejam equivalentes, moralmente falando. A alegação de Dore sobre a ausência de uma diferença moralmente relevante entre o caso em que Deus não tem disposição para intervir para evitar que possíveis pessoas perfeitas cometerem erros que, de forma contrária, podem se desviar e o caso em que Deus não tem disposição para intervir para evitar que as pessoas comuns cometam erros, não é convincente à luz da relação entre Deus e a ordem criada. Pois, dado que Deus tem conhecimentos práticos e que os contextos são determinantes do valor moral das disposições, uma disposição divina de não intervir no caso em que é conhecido que nenhum mal ocorrerá certamente não é equivalente à mesma disposição para não intervir em casos em que é conhecido o grande mal. E se, como Dore permite, pode haver livre arbítrio sem a ocorrência de irregularidades, e o livre arbítrio é permitido referir-se à capacidade de escolher (como argumentamos aqui), devemos reabrir seriamente a questão da bondade de Deus, senão o poder de Deus.

Notas

[1] Alvin Plantinga, Deus, a liberdade e o mal (Editora Vida Nova)

[2] Ibid. p. 53. Embora Plantinga diga isso, ele continua argumentando nos capítulos seguintes que este é o melhor mundo possível, ou seja, que Deus não poderia ter criado um mundo com tanto bem moral e menos mal moral ou menos mal natural do que este. Deus, então, não poderia, de acordo com a análise final de Plantinga, ter atualizado um mundo "contendo um melhor equilíbrio entre o bem e o mal amplamente morais" (p. 59).

[3] Clement Dore, Moral Skepticism (N.Y .: St. Martin’s Press, 1991), p. 57

[4] Ibid. p. 58

[5] Ibid. p. 58

[6] Ibid. p. 59.

[7] Ibid. p. 59.

[8] Além disso, deve-se notar que, uma vez que a definição de ocasiões O estipula a falta da intervenção de Deus, a alternativa de Deus intervir nas ocasiões O não é viável.

[9] Ibid. p. 59.

[10] Ibid. p. 60

[11] Ibid. p. 62

[12] Ibid. p. 62

[13] Ibid. p. 62

[14] Pode-se objetar que existem coisas como disposições inactualizadas de tal forma que se Jones fosse prejudicar Smith, ao contrário do fato, um terceiro, Brown, teria impedido Jones de agir. Isso equivale a dizer que Brown tem a capacidade de se comportar dessa maneira e parece uma maneira perfeitamente aceitável de falar. Mas não é nada claro que vis-à-vis Deus, disposições não realizadas são relevantes. Muitos teístas assumem que Deus não tem a capacidade para o mal ou uma "capacidade" para qualquer coisa para a qual Deus ainda não possui uma disposição. E isso implica que Deus é imperfeito, visto que normalmente se presume que Deus é totalmente atualizado. Conseqüentemente, disposições não realizadas em relação a Deus são problemáticas, a menos que se aceite um conceito semelhante a um processo no qual Deus está em um estado de devir.

[15] O exemplo pode ser encontrado em John Locke, An Essay Concerning Human Understanding, editado por Steven M. Cohn em Classics of Western Philosophy (Indianapolis: Hackett, 1977), pp. 505-6.

[16] Harry G. Frankfurt, ‘Alternate Possibilities and Moral Responsibility’, em Moral Responsibility (ed. John Martin Fischer) (Ithaca: Cornell University Press, 1986), pp. 143-52.

[17] Dore, op. cit. p. 64

[18] Ibid. p. 65

[19] Ibid. p. 65

[20] Ibid. pp. 65-6.

[21] Parece que Dore está mudando o ônus da prova exigindo que o ateu argumente contra a possibilidade de Deus (argumento O). Este argumento não parece relevante para a presente discussão.

[22] Dore, op. cit. p. 67

[23] Ibid. pp. 67-8.

[24] Uma abordagem, que não será tratada aqui, envolve a questão da presciência de Deus (ou a falta dela). Pois se pode ser mostrado que Deus não tem conhecimento prévio de atos hediondos, então não há obrigação correspondente de prevenir o mal.

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